quarta-feira, agosto 28, 2013

O Jovem Cidadão David


O jovem cidadão comparece à plataforma
O tiro seria fácil se não fosse inútil
O vento venta e vamos pra beirada
O trem que chega é o mesmo que sai?

Um vagão depois do outro
Dez vagões depois de um
Ao entrar espere sair
Os sentados permanecem
Quem está de pé varia
mas não muda
Há quem apronte
e há quem desarrume

Como ratos em buracos
apontamos nossa cara no sol
só depois de garantir a saída
E o jovem acredita
um propósito vazio
ainda sustenta seu sentido.

sexta-feira, agosto 23, 2013

Sessão Jogo de Tabuleiro - Claustrophobia - Nas Profundezas

Tudo isso aconteceu ali na mesa, numa sessão contra minha namorada. O jogo é um 'dungeon crawler' um contra um muito legal. O contexto é de luta contra demônios nos subsolos de Jerusalém na idade média. Comecei tentando tirar desse contexto fantástico alguma metáfora de auto-conhecimento, mas desisti. Se algum elemento parecer repetitivo ou fora de lugar, é porque descrevi exatamente o que acontecia na partida. Eu controlava os humanos liderados por um padre e a outra controlava os inimigos. Foi bastante equilibrado, sendo decidido apenas no último turno. Segue o exercício de narração:


Nas Profundezas:

Parte Um

Eu olho para dentro e a luz divina que inunda o mundo perde a força e decai logo a frente. O elemento úmido domina o ambiente e transmite uma noção de profundidade. O cheiro da matéria orgânica é tanto vida quanto morte. O podre viceja, a vida definha. Acendo a lamparina, o fogo tanto queima, quanto limpa. Deus se faz presente. A escuridão se afasta para os arredores do espaço. Desço o degrau de pedra que parece marcar o limite da intervenção humana na realidade daquele lugar. O Medo aponta a sua cara verde no momento em que piso na terra carnosa. Ele vem de onde eu não vejo e some assim que alcanço a minha arma, a Fé. Clareiam-se as paredes, o antro está vazio. É um quarto e com três passagens escuras. Chamo os outros humanos que adentram devagar. Dois irmãos mercenários não suportam o cheiro e cobrem as faces com lenços vermelhos. As facas em punho firme vibram eficiência. Por último, entra pesado, um pequeno gigante (chamado Razão). Armado com uma espécie de foice, ele rosna ao atravessar o portal de pedra. Traz consigo um largo escudo de metal. Seu passo alastrado perturba e parece pedir uma resposta, que vem num grito rachado, escutado ao fundo. Não estamos sozinhos.

Desembainho o martelo de guerra, e escolho a passagem à frente. O Bruto me acompanha. Nos passos além, um buraco no chão -algo grande morou ali- e o final do corredor. Escuto gritos e me volto, os irmãos estão em combate. Três demônios menores os atacam raivosamente. Ferem o loiro, que sente. Seu irmão reage e abate dois no manejo da espada. O terceiro se desfaz na testa dura do meu martelo. Seu crânio racha e exala um cheiro acre. O Silêncio toma conta. Trocamos olhares e seguimos pela passagem da direita. Não há tempo. Avançamos eu e o mercenário ferido, que agora parece ainda mais afiado. O ruivo e o bruto cobrem a retaguarda. Mais a frente uma picareta largada no chão denuncia a perdição de alguém pela Ganância. Então outro impasse. Retornamos e seguimos pelo último caminho restante. Na vanguarda, minha lanterna ilumina de repente um Demônio de Combate muito grande, acompanhado de dois pequenos que se articulam em torno dele. Que Deus me dê força, sou atacado. Suas garras rasgam as minhas camadas. A Dor abala, mas a Fé renova e me faz golpear em resposta. Acerto o largo corpo do Demônio que se abala e recua o suficiente para que o ruivo, em um salto, o golpeie fatalmente. A espada atravessa o couro mais fino do pescoço e faz o grito do monstro soar afogado e borbulhante. Um grosso jorro de sangue quente atinge o braço do mercenário quando ele retira a lâmina. O Guarda-Costas dá um fim na agitação dos dois menores sem mais dificuldades. Estou seriamente ferido. Olho dentro da mochila a promessa do fim dessa Insanidade. Precisamos avançar e obstruir o canal. Espero que não seja muito mais a fundo.



Parte Dois

Seguimos mais um pouco e os caminhos se multiplicam. À minha frente outro Demônio de Combate aparece. Dessa vez o Bruto Guarda-Costas está comigo. Ele toma o dano demoníaco principal, enquanto eu me ocupo dos menores. Os Irmãos, mais atrás, também enfrentam problemas. Hordas se derramam sobre eles, que não saem ilesos da peleja. Num golpe de retruco o Bruto abate com a Sorte o Demônio, que cai já solto no chão. A afiada foice rompeu a medula na base da cabeça. Findado o atrito sangrento, seguimos então em duplas a romper os rumos. O ritmo diminui na medida em que meu sangue vaza e a exaustão amarra os membros.  Com as defesas minadas pelo cansaço sinto uma possessão demoníaca ter o início, mas me encho de Deus, revejo a Missão e Fé de novo me protege.

Olho pistas num mapa velho e avanço apressado. De repente o cômodo, claramente mais quente, parece respirar. Um bafo morno paira no ar viciado. Ilumino e me vejo em um grande ninho sinistro. Barulhos brotam do chão e das paredes cobertas de ovos. A Ânsia separa o grupo. Apresso-me para o próximo cômodo que também é um ninho. Afobado sigo sozinho numa passagem que se faz inválida, enquanto muitos demônios menores vingam dos ovos e nos atacam, se colocando entre mim e os companheiros espalhados. O ruivo consegue abater dois antes de ser estraçalhado pelas bocas famintas de carne humana. Seu irmão consegue escapar e se move na minha direção. Ferido não consigo me desvencilhar do menor que enfrento e que é, de alguma forma, mais forte. O Bruto se posta em defensiva e detém a onda um pouco mais atrás. É quando percebo que nunca vou sair inteiro desse buraco fedido. Já manejo meu martelo com dificuldade e acabo sucumbindo com um violento ferimento na virilha. O mercenário passa em corrida por mim e pega a mochila de explosivos. Ele segue mais a frente e finalmente encontra a garganta aberta que vomita essa danação. Um grande buraco no fundo do túnel. Ele prepara os explosivos enquanto os demônios o alcançam. Ele já está sendo comido quando arremessa a mochila no buraco, que explode. O túnel desaba. Eu rezo alto enquanto testemunho o demônio que se alimenta da minha genitália e entranhas ser soterrado junto com tudo mais. Vitória enfim. Que o Senhor me conduza ao paraíso prometido.


FIM

sábado, agosto 03, 2013

Ciclagem

Abrir
Ver o que inicia
Sentir o que atualiza
Amar a potência dos astros
Abandonar o que tem fim
Ser um e
não ser
nada